Noite dos Cristais - Capítulo da obra "Por Amor e Fé, Os Dias em Auschwitz"
Noite dos Cristais - Capítulo da obra "Por Amor e Fé, Os Dias em Auschwitz" Ficção para ensinar história. contato: ensinartexto@gmail.com
HISTÓRIA COM FICÇÃO
Jamila Mafra
10/18/20253 min read


Dentro do alojamento do campo de concentração, por várias noites, ao me deitar na cama-beliche suja e desconfortável, fechava meus olhos e vinham à minha mente imagens das coisas que aconteceram tempos antes dos fatos culminarem em toda aquela realidade de dor e destruição, uma destruição da vida e da alma.
De novo pude ver as chamas arderem diante dos meus olhos. Berlim havia sido incendiada na noite de 9 de novembro de 1938. O brilho das labaredas era o sinal do ódio que viria dali por diante por parte do governo nazista.
Naquela semana eu visitava alguns irmãos Testemunhas de Jeová na capital. Fizemos planos de continuar nosso trabalho missionário, mesmo diante das perseguições que há tempos haviam começado.
Em todo o país iniciou-se uma onda de violência contra os judeus por parte do governo alemão, mas fizeram com que tudo isso parecesse uma manifestação natural de revolta da população contra o assassinato de um oficial alemão por um adolescente judeu em Paris.
Na época, o ministro da propaganda nazista, Joseph Goebbels, e outros líderes haviam organizado as chacinas contra os judeus muito tempo antes destas coisas acontecerem, de modo cuidadoso e muito bem planejado. Tudo tinha que parecer algo vindo do povo alemão, uma espécie de revolta popular contra aqueles que, de acordo com o Reich, deveriam ser eliminados.
A partir daquela noite, em questão de dois dias, cerca de duzentas e cinquenta sinagogas foram queimadas, em torno de sete mil estabelecimentos comerciais judaicos foram depredados. Não é preciso nem dizer que durante essas duas noites dezenas de judeus foram mortos, sem contar que cemitérios, hospitais, escolas e casas judias foram saqueados.
O que mais me chocou foi que tudo isso aconteceu diante da polícia e dos bombeiros, que nada fizeram para socorrer as pessoas, nada fizeram para apagar o fogo que consumia a cidade em labaredas de ódio.
Estou apenas contando o que eu vi acontecer, não sei dizer se poderia existir um motivo que justificasse tanta morte e destruição, um motivo que justificasse as atitudes do governo alemão diante dos judeus.
O Terceiro Reich queria sangue, queria mesmo era despertar o ódio nos alemães. Aquela noite em que Berlim ardeu em chamas ficou conhecida como “Noite dos Cristais”, ou ainda como “Noite dos Vidros Quebrados.”
— Milhares de judeus estão sendo presos e mulheres judias também foram detidas e enviadas para prisões locais — minha amiga Margareth entrou correndo pela porta da sala, contando a notícia. Passei uns dois dias em sua casa. As ruas de Berlim já não eram mais tão seguras.
— Depois da noite passada não poderia ser diferente — eu comentei cabisbaixa.
— Eu queria entender o porquê de tudo isso. Existe algo que justifique tamanha barbárie? — Margareth me perguntou, como se eu soubesse a resposta.
— Não sei dizer se é possível existir uma razão que justifique tanta crueldade. Muitos dizem que os judeus estavam roubando nosso país, dominando nossa economia, tomando conta de tudo o que pertencia aos alemães.
— Mas, Mia, se isso é verdade, por que não apenas exilá-los? Por que não apenas expulsá-los da Alemanha em vez de causarem tanta morte e sofrimento?
— Um governo ditador como esse não se conformaria por apenas exilar os indesejáveis. Temo que agressões como essas cheguem até nós, cristãos.
— Acredito que é só uma questão de tempo para termos que escolher entre a adoração a Hitler ou a morte — Margareth me disse com olhos lacrimejantes e assustados.
— Concordo. Já não tenho nenhuma dúvida de que o coração dos governantes desse mundo pertence ao maligno. Sangue e horror é o que eles querem. — Naquele momento Margareth e eu nos abraçamos.
Após a “Noite dos Cristais”, os adolescentes e crianças judias foram proibidos de frequentar os museus, parques e piscinas, e também foram expulsos das escolas públicas.
Os jovens, assim como seus pais, passaram a viver totalmente segregados naqueles países. Desesperados, muitos judeus cometeram suicídio.
